Zero à esquerda

by Manuel Jorge Marmelo | Literature & Fiction |
ISBN: 9781484087978 Global Overview for this book
Registered by ichigochi of Vila Nova de Gaia, Porto Portugal on 1/30/2014
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Journal Entry 1 by ichigochi from Vila Nova de Gaia, Porto Portugal on Thursday, January 30, 2014
Do autor de O Silêncio de Um Homem Só, premiado em 2005 com o Grande Prémio do Conto Camilo Castelo Branco, Zero à Esquerda é uma nova incursão de Manuel Jorge Marmelo pelas narrativas curtas, tendo desta vez como pano de fundo a geografia e a cultura de Cabo Verde.

Crítica no Bibliotecário de Babel.

Journal Entry 2 by ichigochi at Vila Nova de Gaia, Porto Portugal on Sunday, February 16, 2014
Este foi o livro escolhido para a 2ª tertúlia do Clube Literário de Gaia, que decorreu no passado dia 14, na livraria "Velhotes".
Nunca tinha lido nada deste autor e confesso que fiquei um bocadinho de pé atrás quando percebi que se tratava de uma "auto-edição" de uma colectânea de contos com o tema/cenário comum de Cabo Verde, a que o autor adicionou alguns textos que tinha publicado previamente no blog dele. No entanto, talvez por ter expectativas tão baixas, fiquei surpreendida pela positiva com a qualidade geral da escrita e dos textos. As gralhas, que esperei encontrar por falta de revisão, também são quase inexistentes. Na verdade, comparado com alguns livros editados por "editoras a sério", este livro seria capaz de fazer melhor figura :)

Apesar de pequeno, o livro reúne um total de 20 contos. Começa por nos apresentar contos mais longos, com a tal temática de Cabo Verde e que ocupam mais de metade do livro, e depois oferece-nos muitos textos sobre assuntos muito variados que parecem ir diminuindo de tamanho até ao final da obra (muitos destes têm apenas 1 página). Esta organização do livro leva a que a nossa leitura não esmoreça e até pareça ganhar velocidade no final... :)
A escrita é muito límpida e o livro lê-se muito bem mas devo dizer que nem sempre achei o enredo interessante. Por exemplo, há um conto de um jogador de futebol de origem cabo-verdiana que joga pela selecção portuguesa mas que tem um pesadelo recorrente: no sonho ele está a jogar pela selecção de Cabo Verde nos minutos finais do jogo decisivo para o apuramento para o campeonato mundial, tem a hipótese de marcar o golo que lhes dará a vitória e falha... Percebo que, com este conto, o autor pretendia falar do sentido de "identidade" e dos dilemas enfrentados pelos deslocados e desenraizados mas não me identifiquei com aquele drama específico... Na tertúlia, o autor explicou que tinha escrito este texto por altura do campeonato mundial (de 2004?) e que na altura achou que fazia sentido usar esse contexto para focar este assunto da identidade.

Depois o próprio cenário de Cabo Verde também não me diz muito, porque nunca estive lá. O autor disse que esteve 3 vezes em Cabo Verde, em trabalho (em reportagem para o Público), sempre com estadias muito curtas, mas que o país lhe causou uma impressão duradoura. O cenário, a geografia física mas sobretudo a humana. Foi assim que surgiu o primeiro conto relacionado com Cabo Verde: ao ser convidado pela Fnac para escrever um conto para uma colectânea que é editada todos os anos por altura do dia do livro, surgiu naturalmente uma história a partir de uma imagem que lhe ficara gravada de uma menina a vender compotas à beira da estrada (o conto "Doçura" deste livro). No ano seguinte voltou a ser convidado pela Fnac e escreveu um segundo conto inspirado em Cabo Verde: o conto "Zero à esquerda", que dá título a este livro e que segundo o autor é também uma espécie de auto-ironia (o autor sugere que ele próprio é um "zero à esquerda"?).

Do que eu gostei mais neste livro, foi das inúmeras referências literárias que aparecem em vários contos.
Há um conto muito curto que é uma brincadeira inspirada em "A metamorfose" de Kafka: a personagem principal chama-se Chico Cáfeca (não se esqueçam de acentuar o primeiro "ca" :)) e sente uma afinidade tão grande com as moscas e com a forma como elas se movimentam que começa gradual e inconscientemente a mover-se como elas.
Noutro conto, o narrador soube da história de Thomas Pynchon ao ler um livro de Enrique Vila-Matas, e percebe que ele próprio pode ser o escritor americano que nunca aparece.
Noutro conto a personagem principal foi "roubada" a um livro de Vila-Matas ("El viaje vertical"). Nesse livro, a personagem acaba a viagem na ilha da Madeira, mas Manuel Jorge Marmelo ficou sempre com a ideia que daí ele viajaria para Cabo Verde e resolveu escrever essa continuação da história...
As várias referências a Enrique Vila-Matas, que aparecem no livro, sugeriam que pudesse ser um escritor favorito do Manuel Jorge Marmelo. Esta suspeita foi confirmada na tertúlia por Marmelo, que disse ter lido todos os livros daquele escritor espanhol, incluindo as primeiras obras, que nunca chegaram a ser editadas em Portugal... De Pynchon, só leu um livro.
(Eu nunca li nada de Enrique Vila-Matas e fiquei cheia de curiosidade.)
Aqui ele também referiu que a literatura da península ibérica é a "quinta" dele; ele nunca poderia escrever, por exemplo, como o Gonçalo M. Tavares que é mais influenciado por escritores da Europa Central, como Kafka...
Quanto a escritores portugueses, ele é do clube do Saramago (em relação à eterna rivalidade Saramago/Lobo Antunes) e considera que Camilo Castelo Branco foi o cultor por excelência da Língua portuguesa. O Eça de Queirós tinha um mérito indiscutível no uso da ironia e na crítica social mas o Castelo Branco cultivava a língua portuguesa: todas as palavras que usamos estão lá nos livros dele (até a palavra abracadabrante, que Marmelo utilizou no título de um destes contos).

Outra coisa de que gostei neste conjunto de contos, foi do entrelaçar constante entre ficção e realidade.
Alguns contos são narrados na primeira pessoa e por vezes o narrador confunde-se com o autor... chegamos ao fim sem saber se aquilo aconteceu mesmo ao autor ou se se trata de ficção. Num dos contos, o narrador conta como soube de uma história que gostaria de imortalizar e fala dele próprio como tendo escrito alguns livros referindo títulos efectivamente publicados por Marmelo, mas o narrador do conto que estamos a ler não pode ser o autor porque tem mais de 70 anos...
No conto sobre o jogador de futebol, também são referidos nomes reais de jogadores e coisas reais que lhes aconteceram... apenas a personagem principal parece ter sido inventada.
Quando questionado sobre isto, o autor disse que realmente parte muitas vezes de coisas que aconteceram mesmo, com ele ou não, e que depois ficciona a história à volta disso.

Podem ler mais sobre o que se passou na tertúlia nesta thread do fórum.

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